Conforme post anterior, a primeira comissão da câmara dos deputados pela qual o projeto de adesão do Brasil à Organização Europeia de Pesquisa Astronômica no Hemisfério Austral (ESO, European Southern Observatory) passa é a de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CREDN), cujo relator é o deputado Emanuel Fernandes (PSDB-SP). O parecer do Dep. Emanuel Fernandes pode ser lido na íntegra em:
https://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1106352&filename=Tramitacao-MSC+40/2013
Felizmente o voto final é favorável à aprovação da adesão brasileira à ESO, o relator apenas pede alguns ajustes no formato e inclusão das assinaturas. Entretanto, gostaria de comentar alguns trechos menos favoráveis do parecer (p.16):
“Chama-nos a atenção, todavia, a vultosa contribuição financeira a ser integralizada pelo Brasil, em um campo de ciência pura no qual nosso país não tem, ainda, um padrão como a UE ou os EUA, parecendo haver um desbalanceamento entre os aportes que nosso país fará e o eventual retorno que poderá ter, tendo-se, também, a impressão de não haver consenso a respeito desse investimento específico em pesquisa na própria comunidade acadêmica voltada à Astronomia, mais parecendo interessar a um grupo do que ao conjunto da comunidade astronômica, havendo adeptos e opositores aos compromissos firmados nesses pactos, segundo informações que obtivemos nas sondagens feitas. Fiquei com a sensação, em outras palavras, de haver equipamentos e recursos em demasia, para um grupo pequeno de pesquisadores.
Essa conveniência científica, todavia, é da competência precípua de análise da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática – CCTCI, cabendo-nos, no âmbito desta Comissão, apenas endereçar as perguntas que julgarmos convenientes àquele colegiado, tais como: nosso país terá igualdade efetiva de acesso às oportunidades advindas dos pactos firmados ou restar-lhe-á a posição de mero sócio contribuinte e observador? As circunstâncias atuais de produção científica do país permitem uma troca equilibrada? Há consenso, na comunidade acadêmica voltada à astronomia, sobre a conveniência e oportunidade de adesão brasileira à ESO, nos termos e no montante de recursos propostos? Haverá benefícios gerais, para a comunidade científica dessa ou de outras áreas, ou disponibilidade de muito equipamento para poucos cientistas eleitos? São indagações que me vêm à mente e que, certamente, serão objeto de análise aprofundada da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática.”
Em carta encaminhada em mãos ao Dep. Emanuel Fernandes pelo tesoureiro da SAB, Dr. Marcos Diaz, respondemos às questões levantadas pelo mesmo. Abaixo, destaco os principais pontos da resposta:
A ESO funciona de maneira muito eficaz, desde sua fundação (inspirada no CERN), como uma associação de parceiros, onde existe a filosofia de que a participação de cada um deve ser estritamente equilibrada em termos dos investimentos feitos. Assim, a contratação de bens e serviços, por exemplo, normas da ESO asseguram que até 75% dos investimentos de cada país podem retornar como benefícios à indústria local, que participa livremente das concorrências.
A Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) ultrapassa 700 sócios atualmente, tendo produzido mais de 200 artigos no ano passado. Desde janeiro de 2011, membros da comunidade brasileira têm tido acesso aos observatórios da ESO como os de qualquer outro país membro. Segundo relatório da própria ESO, a taxa de aceitação pedidos de tempo nos telescópios tem sido percentualmente igual às dos outros países membros, ou seja, 25% no VLT e 50% nos outros telescópios. Em 2011, foram publicados 45 artigos com participação de autores de instituições brasileiras mostrando resultados de observações da ESO.
Há uma demanda reprimida, que é mostrada pelo número de artigos que já temos produzido com dados da ESO, antes mesmo de sermos sócios, através de colaborações. Isto ocorre pela grande diversidade e alto desempenho dos equipamentos da ESO. No período 2006-2012, brasileiros produziram 287 artigos, com dados da ESO, sendo 115 deles com primeiro autor brasileiro. Pode-se projetar que ao entrarmos na ESO, o potencial de produção de artigos deve se amplificar.
A ESO funciona segundo o princípio de equilíbrio entre seus membros, e existem mecanismos compensatórios internos, que procura intervir, quando algum estado-membro apresenta tendência de baixa, seja em sua participação cientifica, seja industrial. Isso ocorreu por exemplo, com a Espanha, no início da década. Cremos então, que esse mecanismos internos deverão otimizar rapidamente a participação brasileira.
De fato não há consenso sobre a adesão do Brasil à ESO, entretanto, conforme post anterior, a oposição reflete menos que 10% da opinião da comunidade brasileira ativa em Astronomia.
O custo total do acordo ESO é realmente alto, 270 milhões de euros, a ser pago em 10 anos uma vez que é calculado a partir do PIB do país. Entretanto, levando-se em conta, que a renda-per-capita do Brasil é baixa, e que o número de astrônomos da comunidade brasileira é pequeno em relação ao nosso PIB (países membros da ESO com PIB semelhante têm quatro vezes mais astrônomos que o Brasil) o acordo teve algumas salvaguardas:
Contribuição única de 130 milhões de euros (menor em comparação com a dos outros países) a ser paga em prestações nos próximos 10 anos;
Escalonamento da contribuição anual que será paga integralmente somente daqui a 10 anos. (25% em 2012, 50% em 2013, 80% em 2015-2016, 90% em 2017-2020);
Isenção de pagamento do E-ELT (250 milhões de euros pagos pelos outros países membros).
Adriana Válio
Presidente
Sociedade Astronômica Brasileira